quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

Caminho sem volta

Caminho sem volta

Quando a morte vem não admite desculpas. Não adianta explicações qualquer que seja o tipo de religião, crença ou modo de agir. Sempre seremos incapazes de escolher o nosso destino. A incerteza, esta sim permanecerá por todo o tempo em que estivermos neste planeta de provações, de crescimento, de abnegações, de erros e acertos que nos instigam em todos os instantes. Cabe-nos apenas aceitar ou rejeitar. O que somos ou fomos pesará no exato momento da partida. Partida esta a qual ignoramos o destino por mais que acreditemos em Algo Superior. Nesta hora a ansiedade se agiganta. Procuramos nos conformar sustentado na hipótese de um retorno, um novo encontro com todos aqueles que conhecemos. Serão várias as sugestões, mas uma, apenas uma será por nós a escolhida ou quem sabe, pré-determinada. Cabe-nos aceitá-la levando em conta que tenha sido fruto do nosso comportamento, nossa forma de vida, durante todo o tempo em que permanecemos neste Planeta.


* * * 

terça-feira, 5 de novembro de 2013

Juventude da Velhice

Juventude da Velhice


 “ - Sabe quem poderá substituí-lo? O espírito dele que ficou em centenas de corações.”
                                                            Autor desconhecido


Na juventude da velhice, passava a maior parte do tempo em casa. A cadeira de balanço, os livros e um rádio; ferramentas utilizadas para esticar o tempo.
As histórias, contadas ao som da música da tristeza, ajudava-o a enxergar as lições da vida. Vida comparada a que conheceu no interior do sertão onde nasceu e cresceu ao lado do sofrimento, ao lado da seca.
Entre outros tantos bravos, conheci um que deixou a sua terra para tentar a vida na cidade grande. Com salário curto levou uma vida regrada. Casar e educar os filhos foram as únicas aventuras. Acostumou-se a ter pouco e, com este pouco fazia milagres: uma reserva sempre estava a postos para os dias difíceis.
Adoeceu ainda moço e logo se aposentou. Daí em diante a vida tomou outro rumo. O vigor da força física foi deslocado para a mente, onde a leitura o mantinha atualizado e em constante atividade. Sentia-se forte, vivo ao saber que, embora preso em sua própria casa, ainda podia fazer alguma coisa por alguém. Encontrava na conversa, no bate-papo, um bálsamo fortalecedor. Raros, eram os dias sem visitas. Evitava assim, entrincheirar-se e ser levado a um imaginário distante e distinto do tempo em que viveu.
Lembro-me sentado na cadeira de balanço com os dias minguantes. Livro na mão, rádio ligado, enquanto o mundo lá fora girava sem parar. Ainda assim, nunca perdeu a esperança. Costumava dizer: um dia a minha vida será outra.
As horas de repouso eram mínimas: uma após o almoço e quatro na madrugada, quando as idéias perdiam o brilho, cediam ao sono. Quando perguntado sobre o que sonhara respondia: Não me lembro. A alma presa ao seu mundo - a casa - não alimentava fantasias. Nem por isso sentia-se entregue. Via a vida passar, mas não se entregava, não permitia ser impossível vivê-la. Afastava a solidão, o ostracismo embriagando-se com os diálogos. Certa vez, presenciei um:
- Malaquias, você sabe que Jerônimo vai se casar?
- Não. Com quem?
- Feliciana, a filha de Porfírio, lembra-se?
- Fe li ci a na? Impossível, ele mesmo disse que jamais se casaria com ela!
- Pois é. Mas, quando soube que o pai tinha umas terras, mudou de opinião, resolveu casar.
- Samuel, onde já se viu dinheiro comprar felicidade.
- Tem razão, mas ele não pensa assim.
- O que trás felicidade é ser compreensivo, saber ouvir e agir nas horas certas com poucas palavras. Sugerir ao outro uma alternativa e deixar que ela assuma a ideia.
- Até certo ponto eu concordo. Quando se visa dinheiro, por mais que se ofereça outra coisa o outro nunca ficará satisfeito.
- Depende. Pode ser que a convivência mude as intenções. Entretanto gostar mesmo, sentir amor pelo outro, será difícil. Não considero impossível. Mas, neste mundo, com boa vontade, se consegue tudo. Depois, talvez ele enxergue que o dinheiro não lhe deu felicidade e mude de atitude.
- Ainda acho que, mesmo assim, se ele quer casar porque pensa em ter conforto com o dinheiro dela, dificilmente mudará as intenções.
 - Jerônimo não está sendo sincero, nem com ela, nem com ele mesmo. Depois de algum tempo, vai descobrir que não valeu a pena. A falta de sinceridade lhe trará dinheiro, mas não felicidade. Feliciana poderá demonstrar amor por ele sem receber? Será difícil. Eles vão conviver num mundo de falsidades. A vida de um casal deve ser construída em cima de sinceridade. A sinceridade gera confiança, une. A falsidade separa. A harmonia gera compreensão. A desavença a incompreensão.
- Tem razão, se confiarmos em quem fala, acreditaremos no que ouvimos.
- A conversa é um bom começo para os que querem se acertar. Nada melhor do que concluir uma boa prosa enxergando uma saída para os problemas ou um sentido para a vida. Ficará mais fácil se o outro compreender que existe certa cumplicidade na busca de uma alternativa.
Era assim que meu pai enfrentava o mundo, apesar dos maus momentos que passou. Várias vezes o ouvi dizer: Deus sempre nos surpreende. Se for coisa ruim tento esquecê-las, substituí-las, eliminando-as da mente. Às vezes faço uma troca. O prazer de executar qualquer coisa nos faz esquecer, nos distrai e alivia o sentimento. Experimente. Veja como é fácil.
Desta forma, levava a vida. Lado a lado, juventude e velhice. Estado terminal do corpo, não da alma, nem do espírito. E, segundo ele, o espírito, após a morte do corpo se integra ao todo, ao cosmo para depois voltar... E não concluía a frase. Outra vez me disse: Há vida em tudo. Até na morte há vida. O estado permanente de transformação da matéria faz da morte, vida.


* * *

... e o verbo o fez Poeta.




Lúcio

Nesta data de euforia quando mais uma vitória é alcançada, nada melhor para o discípulo que ousar escrever na língua do Mestre:

... e o Verbo o fez Poeta

Nascer, mamar,
Brincar, correr,
crescer estudar
amar, lazer,
vencer, casar,
trabalhar, viver,
escrever, prosar,
versar, ser:

luz - Lúcio


Dedica-lhe,  

Saulo e família


10/02/2000

segunda-feira, 23 de setembro de 2013

Hora da Renovação


                                         
“A alma do homem é como água; vem do céu e sobe para o céu, para depois voltar à Terra, em eterno ir e vir.”
           
                                                                Goethe


Quando se é jovem tudo se ajusta se encaixa, desde a escuta do simples som de um tambor aos dos mais sofisticados instrumentos. O corpo pede a perfeição, a música a partitura. A regência é onipotência, onisciência. Não existe o amanhã. Tudo é o presente, o agora.
No entanto, nada disso é duradouro. Com o passar do tempo, inicia-se um novo ciclo. O corpo sinaliza; o cansaço exige passos lentos, atitudes moderadas. O homem atônito, dança fora de ritmo e, sem saber o porquê, procura na religião alento. A mudança se inicia. É chegada a hora. Hora da partida. Hora da renovação.

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sábado, 21 de setembro de 2013

Embarcações

Na parede a pintura de um barco trouxe-me lembranças da adolescência. Majestoso, aguardava-me nas águas do mar de Olinda. Juntos, saíamos em busca de sustento. Quantas vezes isto aconteceu, não sei. Há muito e por muito tempo esta rotina foi trabalho, distração, vida. Aos quinze anos recebi um barco de tios que viviam da pesca. Por um período de um ano, todo fim de semana, ia conferir o andamento, ver detalhes da sua construção, pensar nas cores: Azul, vermelha, cinza. No dia em que ele me foi entregue, batizei-o com o meu nome: Patrício. Criara a identidade. Não me perguntem o porquê. Talvez no decorrer do conto, consiga transmitir o que na época não consegui saber.
Órfão, aos dez anos fui morar com os tios. Passava uma temporada na casa de um, ia para a casa do outro; deste modo, cresci. Sobre o mar assimilei tudo o que me ensinaram. Quando voltava cedo da pescaria, ia à escola. Nesta luta, consegui terminar a oitava série. De poucas amizades, sempre gostei de ficar só. No mar podia dizer, pensar, agir. Algumas vezes, falava e o barco respondia em meu segundo pensamento. Numa dessas ocasiões:
- As ondas lembram seres humanos. Você nota semelhança?
“Sim. Olhe esta: forte, alta, vem com arrogância. Quer se impor pela força, pelo barulho ao quebrar, na vontade de dominar-nos.”
Respaldados pela experiência, a recebíamos de proa, sem medo. Passávamos por cima como se nada nos tivesse atingido. Víamos ao longe a fúria se desmanchar em espuma. Voltava branda reunindo energia, se agrupando para uma nova investida. Batiam a bombordo ou a boreste, mas nunca conseguiram derrubar-nos. Outras passavam suaves, com educação. Pareciam cumprimentar-nos. Voltei à conversa:
- Veja o que é o mundo. Homem e barco sem distinção ao enfrentar a vida. As ondas são para você o que o ser humano é para mim. - e o segundo pensamento me deu sua resposta:
“Está enganado. Ondas só demonstram temperamento: forte, fraco, ausente. O homem vai além. Apresenta-se com inteligência, ignorância, astúcia, traição ao se determinar por querer. Quando enfrento as ondas, logo distingo seu modo de agir. Coloco-me em posição de defesa. Elas não mudam; por isto, jamais o coloquei em risco. Todos os dias vamos para o alto mar. Passamos por momentos difíceis sim, mas soubemos superá-los. A técnica nos guia.”
- Você tem razão. Por serem previsíveis, torna-se mais fácil lidar com elas. O sucesso estará garantido se conhecermos as condições de navegabilidade e tivermos boa saúde.
“Com o ser humano a coisa é outra. Sempre surpreende.”
- Concordo, para decifrarmos o que quer, demanda tempo. Às vezes, nem conseguimos. E aí passamos pela vida sem viver, fazer, ou ser.
Hoje, impedido de velejar, lembro-me das idas e vindas que fazia. Estou feliz. Tenho casa, mulher e filhos já independentes. Nenhum seguiu a profissão de pescador. As histórias contadas, talvez os tenha induzidos a seguir outro destino, diferente do meu. Não interferi na escolha. Tiveram livre arbítrio. De tudo isto uma coisa é certa:
Cada um tem seu barco e seu mar.



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sexta-feira, 20 de setembro de 2013

Feliz com a morte

    

                                       Feliz com a morte


Já nada espero do futuro
as esperanças nele traçadas,
cedem ao escuro
de tumbas enlameadas

Aceitar a vida doravante
é admitir de antemão
ter muita sorte.

... e por que não dizer então!
“Serei feliz com a morte”.


* * *

Vida



Vida

Mundo velho
Mundo novo
Solo cansado
Solo fértil
Ar morto
Ar puro
Parentes, amigos
Saída saudosa
chegada feliz
desencontro
reencontro

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Meus Setenta Anos



Meus Setenta Anos


Queria aproveitar este momento para dizer algumas palavras de agradecimento aos meus familiares e amigos aqui presentes. Aos que não puderam vir por razões outras também estendo meu agradecimento .
Considerei o doze de setembro de 2011 quando completei meus setenta anos, mais um desafio. Entrar na década dos setenta me fez lembrar todos nós somos embarcações a navegar por mares desconhecidos.
No meu caso particular tenho convicção que tempestades e calmarias ainda serão freqüentes em outras viagens. Entretanto tenho segurança que as ultrapassarei com a ajuda da tripulação (familiares e amigos) que ainda me acompanha. Sei que não será tarefa fácil, mas não me intimidarei. O importante na vida é saber agradecer à tripulação que tanto contribuiu para tornar minhas viagens navegáveis. A ela meu sincero agradecimento;
Em especial atenção, num obrigado diferenciado, à timoneira (minha esposa) que soube ajudar na manobra com o leme desviando o barco dos obstáculos, ancorando-o nos portos seguros. Em quaisquer que fossem as situações e sempre demonstrando seu real sentimento,  “Beijos”;     
Aos marinheiros de outrora, hoje capitães (meus filhos) que conduzem seus próprios barcos, um obrigado com orgulho por serem o que são. “Continuem a navegar até encontrarem mais portos seguros.”;
Aos marinheiros de primeira viagem (meus netos de sangue e afins) que se lembrem das histórias e brincadeiras que não foram em vão. A intenção era deixar algo construtivo: “amor, respeito ao próximo e compreensão da vida”;
A todos os demais presentes que considero parte da tripulação, meus sinceros agradecimentos.
Saulo Marden
29/09/2011 

domingo, 15 de setembro de 2013

O tempo passa



Passagem do Tempo

O tempo passa
carrega vidas
entristece o povo
deixa estórias
e o livro guarda
marca datas
fixa memórias
da criança de violência adulta
do adulto de atitude infantil
e o mundo gira, não se altera
enquanto o homem aguarda e espera
a virada do milênio e o fim desta era. 

                                                      




Lúcio

Nesta data de euforia quando mais uma vitória é alcançada, nada melhor para o discípulo que ousar escrever na língua do Mestre:

... e o Verbo o fez Poeta

Nascer, mamar,
Brincar, correr,
crescer estudar
amar, lazer,
vencer, casar,
trabalhar, viver,
escrever, prosar,
versar, ser:

luz - Lúcio


Dedica-lhe,  

Saulo e família


10/02/2000

segunda-feira, 9 de setembro de 2013

Até Quando

Texto sem utilização de verbos:

 
              Até Quando?

Antes, um homem de trinta anos com todo o vigor.
Hoje, na cama de um hospital; barriga para cima, olhos fixos no teto.

Para ele: ausência de cores, mente de um morto vivo. 
              
Para os médicos: Falta de movimentos, baixa reação neurológica.
                          Fraco batimento cardíaco, dificuldade na respiração.

Ele, confiante nos médicos.
Estes, na evolução da ciência.

Ficha médica: Estado letárgico.


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Ana Sim

                                           Ana, sim

“Sentido de vida não se dá de presente a ninguém: é conquista e descoberta de cada um.”
Theresinha M. L. da Cruz

O que mais almejas da vida? A de hoje não é suficiente? Se lembrares que Ele foi quem a mandou ao mundo num anti-projeto, não duvidarás jamais.
O livre arbítrio faculta esboçar, traçar e materializar o projeto de vida de cada um. Ele, o Arquiteto do Universo a impulsionou aos condicionamentos tão explícitos e aceitos por ti: autenticidade, bondade, simplicidade. Eles são os pontos fortes que a torna responsável, admirada e útil aos necessitados.
Em dias especiais, nada melhor do que ler um trecho do livro “Ana – Não” de Augustin Gomes – Arcos: “.Difícil e impossível viagem de regresso, ao arrepio de uma memória imprecisa, enrolada sobre si mesma...” ... “ Vamos, vamos, nada de idéias negras. É um presente de aniversário. E os presentes de aniversário não secam assim, tão às carreiras.”
Se esse escritor hoje estivesse vivo quem sabe se o título não seria Ana – Sim?

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sexta-feira, 6 de setembro de 2013

Trajetos da Vida






Trajetos da vida

Vida é volátil
 perfume também
presentear é tátil
receber faz bem.

Convivência não é fácil
tolerância também
doar-se é tarefa febril
aceitar é um bem.

Morte é sólida
amor construído também
reconhecer é obra válida
perpetuar faz bem

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Receita de vida




Receita de vida

“... para sempre e por muitos os séculos.”


Ouvir com carinho, nem tanto.
Fazer o que pede, se muito insistir.
Teimar sobre qualquer assunto, sempre.
Levantar a voz, algumas vezes.
Acordar depois do outro, vício triste.
Dormir na mesma hora, coisa rara.
Acender o fósforo, a água molhou.
Falar, nem me atrevo.
Amar com afeto, sim.

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